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INTERPRETAÇÃO: PSICANÁLISE E POESIA

Maria da Glória S. Telles da Silva

Recebemos, no último dia 29 de março, na BSFreud, a psicanalista Beatriz Duró, membro da Escola Freudiana de Montevidéu desde muitos anos, que vive e desenvolve sua clínica na cidade de Montevidéu, Uruguai. Muitos de seus escritos são frutos de seu interesse pelas obras de poetisas que terminaram suas vidas através do suicídio, como Alejandra Pizarnick e Alfonsina Storni. O trabalho que a trouxe a Porto Alegre foi escrito a partir de um longo e consistente estudo da obra da poeta brasileira Ana Cristina César. A poeta Ana C., como também é conhecida, nasceu no Rio de Janeiro, em 1952, e suicidou-se em 29 de outubro de 1983, também no Rio de Janeiro.

Tendo como ponto de ancoragem a questão da interpretação, Beatriz Duró tramitou entre psicanálise e poesia buscando dar sua  contribuição a este enigma com o qual todo psicanalista  não cessa de defrontar-se: até onde a letra pode dar sustentação ao ser?

Apoiada em Freud e Lacan, considera a poesia como uma nova ordem de relação ao simbólico e daí sua pertinência ao campo da interpretação. Aproxima o modo de produção inconsciente e o modo de produção poética, no momento em que ambos buscam tocar algo da verdade em relação ao  inconsciente. Diria que nos leva a pensar na existência de semelhanças entre a criação poética e o trabalho do analista que, desde sua interpretação, permite o surgimento para o analisante de uma outra leitura de seu texto.

Num trabalho prenhe da poesia de Ana C. (e que tivemos o privilégio de escutá-las pela voz do poeta Isaac Starosta), Beatriz Duró dividiu conosco as questões suscitadas pela pena da poeta. Como encontrar um lugar legítimo onde inscrever a letra, após se virar do avesso e se tocar o limite deste inominável  que é a vida, onde o horizonte é o nada? Ana C. escreve: É preciso mais uma vez uma nova geração que saiba escutar o palrar dos signos. Lembra-nos assim do constante desafio de que mesmo já tendo construído um imenso universo de linguagem, não esgotamos as impossibilidades de nomear o real. Disse-nos Beatriz Duró: “O poeta não busca colocar sinais nas placas de trânsito, uma coisa substituindo outra”. E, citando a Ana C., lembra que a linguagem poética “quer dizer sem dizer”. Lança-nos ao universo do sem sentido para que cada um, neste encontro faltoso, ache seu próprio sendo. Um efeito de real.

         Assim nos marca Ana C.:

Por afrontamento do desejo
insisto na maldade de escrever
mas não sei se a deusa sobe à superfície
ou apenas me castiga com seus uivos.
Da amurada deste barco
quero tanto os seios da sereia
. (A.C.)

         E assim assiná-la Beatriz Duró: do acosso de um desejo, Ana C. responde com a “maldade de escrever”, uma “forma de bater para se fazer um buraco no Outro”.         


Leia aqui o texto do seminário.
 
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