FALO NO JARDIM
Priapéia Grega, Priapéia Latina

Tradução do Grego e do Latim,
Ensaios introdutórios,
Notas e Iconografia

João Angelo Oliva Neto


Ateliê Editorial e
Editora da Unicamp,
2006




FLÁVIO RIBEIRO DE OLIVEIRA,
escreveu para a Folha de São Paulo, em 17 de setembro de 2006.

Priapéia" é uma coletânea de breves e jocosos poemas anônimos, compostos em latim entre os séculos 1º a.C. e 1º, cujo tema é Priapo, deus da fertilidade, burlesco e itifálico (representado normalmente em estado de ereção).

O culto de Priapo surgiu na Ásia Menor por volta do século 4º a.C., de onde se difundiu pelo mundo grego e, mais tarde, pelo romano.

Priapo era um deus menor, disforme e desprovido da imponência e da beleza severa dos olímpicos. Mas, por isso mesmo, era popular entre as classes mais humildes da população que, além de considerá-lo protetor da fertilidade animal e vegetal, se valia de seu caráter apotropaico: Priapo seria capaz de afastar malefícios e maus-olhados que pudessem prejudicar a virilidade dos homens e a fertilidade do solo.

Os poemas da "Priapéia" têm, pela própria natureza do deus, um caráter zombeteiro e francamente obsceno -o que perturba sensibilidades mais delicadas. São, até hoje, pouco conhecidos, pouco estudados e pouco traduzidos. "Falo no Jardim", livro de João Ângelo Oliva Neto, nos oferece não só o texto latino completo e traduções impecáveis de todos os poemas da "Priapéia" mas também todos os poemas da chamada "Priapéia Grega" (coletânea dos poemas priapeus gregos que faziam parte da "Antologia Palatina"), também em edição bilíngüe.

Três capítulos iniciais situam e analisam minuciosamente o fenômeno do culto de Priapo no mundo antigo e suas manifestações literárias; os cinco capítulos finais trazem, respectivamente, poemas latinos de autoria conhecida (Catulo, Horácio etc.) cujo tema é Priapo, mas que não faziam parte da "Priapéia" (texto original e tradução); excertos de poemas que, sem ter tema priapeu, mencionam Priapo (texto original e tradução); os poucos poemas priapeus compostos em língua portuguesa; as raras traduções de poemas da "Priapéia" em língua portuguesa anteriores às de Oliva e, por fim, o texto e a tradução de "Er Padre de li Santi", poema priapeu de Belli, escrito em dialeto romanesco no século 19.


Linguagem franca

Fecha o volume um aparato de grande utilidade para o leitor -esquemas métricos, relação dos epítetos de Priapo, glossário, bibliografia e índices.

Além disso, o livro traz rico material iconográfico. As seções teóricas, de extremo rigor analítico e sólida fundamentação bibliográfica, são de grande interesse acadêmico para o especialista e, agora mesmo, os leitores desta resenha devem estar pensando: "Ah, mais um livro erudito da academia, destinado a meia dúzia de gatos-pingados da academia...". Nada disso. Oliva tem o raríssimo mérito de, sem abrir mão da profundidade que um estudo crítico do tema requer, ser perfeitamente acessível a qualquer leitor inteligente. Seu texto, escrito em linguagem clara e, eventualmente, bem-humorada, nunca apela para jargões acadêmicos abstrusos.

Ao longo dos séculos, a "Priapéia" e os temas priapeus têm provocado indignação pudibunda entre os tartufos e os ilibados defensores da moral e dos bons costumes, desde os pais da igreja até os editores alemães que censuraram a palavra "Priapia" (entre outras) em diversas edições de "Frühlings Erwachen" [Despertar da Primavera], de Frank Wedekind (1864-1918).

Ainda hoje, muitas traduções de obras clássicas de caráter erótico empregam eufemismos ou termos científicos para traduzir palavras que, em grego ou latim, pertencem ao registro chulo da linguagem.

As traduções de Oliva, de grande valor e invenção poética, são rigorosamente fiéis à obscenidade burlesca, à graça provocadora e ao bom humor debochado dos originais. Nelas, a mêntula não é chamada de membro viril ou pipi.


FLÁVIO RIBEIRO DE OLIVEIRA
é professor de língua e literatura gregas
na Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp).